sábado, 23 de abril de 2011

Tarde Demais - Parte Um

Ergui os olhos para o relógio. Seis e vinte e cinco e meu coração acelerou no peito. Faltava tão pouco. Bebi mais um pouco do café que me havia sido servido há pouco, e a garçonete sorriu, parando à minha frente novamente.

— Gostaria de comer alguma coisa agora, querida?

— Não, obrigada. — olhei novamente o relógio enquanto falava. Nem um minuto ainda havia se passado. Como sempre, eu começava a ficar impaciente, embora a ansiedade fosse bem mais forte. Naquele dia eu estava decidida, e só precisava que os ponteiros do relógio marcassem seis e meia para que eu pudesse levar a cabo a minha resolução. Infortunadamente, o Tempo parece zombar de nós nessas horas em que precisamos desesperadamente que ele ande mais depressa, e anda sempre mais devagar.



Fechei os olhos. Fazia frio naquele vinte de setembro, e mesmo assim gotas de suor deixavam meu rosto pegajoso e me provocavam mal-estar. A garçonete sorriu outra vez ao passar por mim, mas desta vez ela não veio perguntar se eu gostaria de algo para acompanhar o café que eu havia pedido. Era exatamente o que ela costumava fazer quando eu aparecia. Sempre insistia uma ou duas vezes na pergunta, mesmo sabendo que eu jamais aceitava nada além de um café. Então ela me servia sorrisos até o momento em que eu largava uma nota sobre o balcão e deixava a lanchonete, religiosamente às sete e dez da noite todas as vezes.

Mais uma vez, olhei para o relógio, implorando para que os ponteiros estivessem onde eu desejava que eles estivessem. Seis e vinte e nove. Esperei. Seis e meia. Me virei para olhar a porta e ver se alguém entrava. Ninguém. Agora, como eu desejava que as horas parassem, o Tempo começou a se apressar. Na segunda xícara de café terminada, os ponteiros já marcavam seis e quarenta, e eu quase desistindo e indo embora. Era sempre às seis e meia. Sempre. Até mesmo quando chovia muito, situações em que fazer tudo se torna mais complicado.

Então a porta se abriu. Olhei rapidamente para trás e resfoleguei ao ver entrar quem eu queria, tentando não me esquecer da decisão que eu havia tomado.

Três meses atrás. Foi a primeira vez em que eu a vi. Vinte de junho. Era um domingo chuvoso e frio e ela entrou sacudindo uma sombrinha lilás e reclamando que a barra de sua calça jeans estava encharcada. A garçonete comunicava a um dos clientes a hora. Exatas seis horas e meia. Acompanhei a mulher que acabara de entrar com o olhar. Depois de falar algo com um senhor sentado à uma mesa próxima à porta, ela veio sentar-se ao balcão, alguns bancos distante de mim. Pediu uma xícara de chocolate quente e muffins. Sorriu tímida, cansada, ao notar que eu a fitava. Percebi em seu olhar uma nuvem de tristeza. Quis perguntar a ela o que havia acontecido. Mas eu não a conhecia. Aquela era a primeira vez que eu entrava naquela lanchonete, e a primeira vez que eu a via.

Às sete e dez então, ela levantou-se, acenou para as garçonetes e foi embora. Notei que o café em minha xícara havia esfriado, porque eu me esquecera completamente de bebê-lo. Fui embora pensando naquele sorriso tímido e cansado e na tristeza que havia naquele olhar.


Continua...

Nenhum comentário:

Postar um comentário